Virgínia Woolf (1882 – 1941): Contos “A mulher no espelho”, “Mrs. Dalloway em Bond Street” e “Objetos sólidos”

CONTOS – “A mulher no espelho”, “Mrs. Dalloway em Bond Street”, “Objetos sólidos”.
Virginia Woolf (1882 – 1941)



CITAÇÕES:

“Nesse ínterim, estando as portas e janelas todas abertas por causa do calor, ouvia-se um perpétuo som de suspiro e suspensão, a voz do transitório e do perecível, parece, indo e vindo semelhante à respiração humana, enquanto no espelho as coisas haviam cessado de respirar e quietas jaziam no transe da imortalidade.” – A mulher no espelho

“Mrs. Dalloway disse que ela própria compraria as luvas. Quando saiu para a rua, o Big Ben ia baten­do. Eram onze em ponto e o tempo incomum es­tava fresco, como que feito para crianças numa praia. Mas havia algo de solene no ritmo vagaroso das reiteradas batidas; algo de excitante no rumor de rodas e no estrépito de pés.” – Mrs. Dalloway em Bond Street

“Quer fosse este ou não o pensamento de John, o pedaço de vidro teve o seu lugar sobre a lareira, onde, com o seu peso, prendia uma pequena pilha de contas e cartas, e servia não somente como um excelente peso-para-papéis, mas também como o natural lugar de pouso para os olhos do rapaz, quando ele os erguia do seu livro. Qualquer objeto olhado repetidas vezes e meio inconscientemente por uma mente entretida com outro pensamento, identifica-se tão prontamente com a matéria do pensamento que perde a sua verdadeira forma e recompõe-se de maneira diferente, na forma ideal que persegue o espírito nos momentos menos esperados.” – Objetos Sólidos


RESENHA:

Há algo que perpassa a obra de Virginia Woolf: o ambiente em que os personagens se encontram e a construção de seus psicológicos são pincelados quase como se fossem quadros em uma galeria. Como podermos notar nas citações selecionadas, a autora pinta, como uma obra de arte, as paisagens que rodeiam os protagonistas de seus contos. Além disso, Woolf torna concretos os pensamentos e devaneios de seus personagens fazendo uso de descrições que situam esses pensamentos e os contextualizam conforme o meio em que se encontram.
Em “A mulher no espelho”, por exemplo, Isabella Tyson cuida de seu jardim enquanto a narradora observa e descreve sua vida cotidiana, refletida no espelho que se encontra na sala da protagonista. Esta, por sua vez, tem pensamentos positivos: preocupa-se em ser uma boa pessoa, procura cultivar o relacionamento com seus amigos e pensa em seus compromissos. No entanto, o espelho representa as mais profundas reflexões e, à medida que a personagem se aproxima e encara-se no objeto que reflete a sua imagem e, por consequência, reflete a imagem de toda a vida que ela leva, o bom e o ruim, a verdade e a mentira confundem-se. Isto ocorre porque, na vida, tudo tem dois lados – ou vários lados – e é apenas através da reflexão que somos capazes de enxergar a partir desses diferentes pontos de vista.
Em “Mrs. Dolloway em Bond Street” evidencia-se a capacidade da autora de retratar paisagens, em detalhes, como quadros em uma galeria de arte. Clarissa Dalloway sai para comprar luvas e caminha pelas ruas de Londres enquanto o narrador as descreve em riqueza de detalhes: ouvem-se as badaladas do Big Ben, o barulho dos carros e o rumor dos pedestres. A protagonista está rodeada de um mundo sobre o qual reflete enquanto concretiza as suas ações: enquanto caminha pelas ruas, encontra pessoas que conhece e, a partir delas, reflete sobre seu passado, seu presente e seu futuro. Por fim, uma vez na loja de luvas, ela observa a vendedora e, posteriormente, outra cliente – uma idosa que também está em busca do mesmo acessório. Deparando-se, portanto, com as ações da vendedora e dessa senhora, Clarissa, assim como no caminho até a loja, tem algumas epifanias e reflete sobre situações que viveu no passado e os impactos que estas causaram em seu presente e seu futuro.
No último conto analisado, “Objetos sólidos”, dois homens – Charles e John – conversam sobre suas insatisfações enquanto caminham pela praia e acabam por encontrar um pedaço de vidro verde na areia. No decorrer da narrativa, descobrimos que os personagens são políticos – homens que trabalham no parlamento – e fica evidente, pela conversa que travavam no início, que estão descontentes com a sua vida, visto que falavam “dane-se a política”. No entanto, John constrói um mundo particular e encontra-se consigo mesmo ao achar aquele pedaço de vidro verde – isto dá um novo sentido para sua vida. Assim sendo, John passa a colecionar objetos sólidos como cacos de vidros de diferentes cores e até meteoritos e os dispõe como adornos em cima de sua lareira, ato incompreendido pelos outros. É possível, portanto, relacionar os “objetos sólidos” com as relações sociais e profissionais do personagem: à medida que ele se afeiçoa aos objetos e torna-se obcecado pelo mundo novo que descobriu, se distancia de sua antiga profissão na política e de sua amizade com Charles – com quem perde a afinidade de ideias.


CURIOSIDADES:                        

·         Por um breve período, Virginia Woolf escreveu em uma mesa alta, em pé, pois ela queria ser como um pintor, que pode se afastar imediatamente da tela para ter uma visão melhor da obra;
·         Ao terminar de escrever “Mrs Dalloway em Bond Street”, conto no qual Clarissa sai para comprar uma luva, Virginia confessou a um amigo que acreditava que o conto não estava completo e ficou tão intrigada com isso que decidiu escrever um romance a partir da personagem que decide comprar alguma coisa. No caso do romance, as flores;
·         Woolf tentou se matar aos 22 anos, pulando da janela de um hospital, porém ela estava no segundo andar e nada aconteceu.
·         No ano de 1941, com o estopim da Segunda Guerra Mundial, a destruição da sua casa em Londres durante o Blitz e a fria recepção da crítica à sua biografia do seu amigo Roger Fry, Virginia Woolf foi condicionada ao impedimento da sua escrita e caiu em uma depressão semelhante às que sofreu durante a juventude. Isto resultou em seu suicídio;
·         Woolf disse que sua morte seria a “única experiência que eu nunca irei descrever”.


AVALIAÇÃO DA LEITURA E DOS CONTOS:


Apesar de curtos, os contos são densos. A leitura, porém, é prazerosa: as imagens constroem-se aos poucos na mente do leitor e sentimos como se estivéssemos passando pelos dramas psicológicos e pelas reflexões dos personagens. A linguagem, por sua vez, traz alguns vocábulos pouco usuais, no entanto, é de fácil entendimento.  

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